Se as últimas notícias sobre a fuga da produção da Inditex para a Turquia ou Marrocos deixaram alguns empresários mais incautos com receio de uma profunda crise na ITV nacional, a MacKinsey & Company vem, uma vez mais, reforçar que pode não ser bem assim.
No seu relatório Ten trends for the fashion industry to watch in 2019, a MacKinsey refere que as estratégias de nearshoring das marcas de vestuário se vão acentuar nos próximos anos (e talvez dobrar até 2025), o que significa o regresso de muitas marcas à produção europeia.
Nesta primeira parte do artigo, a BPLY resume alguns dos principais fatores que estão na base das estratégias de reashoring e nearshoring das marcas de têxtil e vestuário, de acordo com alguns estudos desenvolvidos por vários autores:
Erros de cálculo: detetaram-se falhas na não contabilização de custos de gestão, de coordenação, logísticos e operacionais, que não foram levados em conta pelas marcas de retalho e que, em alguns casos, tornaram a estratégia financeiramente prejudicial (Mattila, King e Ojala, 2012; Porter e Rivkin, 2012; Boston Consulting Group, 2014);
Qualidade do produto: para Porter e Rivkin (2012) a exigência de qualidade tem vindo a subir e qualidade padrão das produções em offshore não tem acompanhado, originando mais custos de controlo de qualidade e remanufactura;
Alterações da procura: Dombrowski, Intra, Zahn, e Krenkel (2015) referem que a exigência de novidade que o consumidor impõe e a forte concorrência internacional, obriga as marcas a desenvolverem e lançar novos produtos todos os meses, reduzindo o ciclo de vida do produto e obrigando à produção de pequenos lotes, para não originar stocks. Tal é também referido, anteriormente, por Cohen e Zysman (1987) que acrescentam o desenvolvimento de uma gama de modelos significativamente aumentada, com requisitos tecnológicos mais elevados;
Enfoque no consumidor: o consumidor é cada vez mais o impulsionador dos processos de criação, levando as marcas a adotarem um comportamento produtivo orientado para nichos e para a customização. O efeito e a preponderância dos influenciadores, redefinem as forças de poder e coloca uma maior pressão na capacidade de alteração de produto. As estratégias de postponement ganham também maior importância, uma vez que significam adiar determinadas tarefas produtivas até ao momento em que se “obtém informação mais precisa, que permita configurar o produto de acordo com as verdadeiras necessidades e expetativas dos clientes“ (Zinn e Bowesox, 1998);
Consumo responsável e sustentabilidade: a consciencialização dos consumidores com o consumo responsável coloca mais ênfase em questões como a responsabilidade social das marcas e a sustentabilidade da atividade. O offshoring é conotado com uma histórica debilidade laboral, trabalho infantil e condições precárias, bem como com a falta de regulação e controlo das práticas ambientais, tantas vezes relatados, fazendo com que subsista, nos consumidores e demais stakeholders, a perceção de comportamentos não éticos e ambientalmente insustentáveis;
Made in: a exploração do efeito de reputação made in ganha especial importância num período de crise de identidade e/ou necessidade de reforço de ideias nacionalistas (Dachs e Kinkel, 2013), bem como nos compromissos com a recuperação das trajetórias de crescimento das economias domésticas.
A Parte II deste artigo abordará as tendências de reshoring e nearshoring da ITV na Europa.